Nova era do tratamento do câncer aposta em procedimentos menos agressivos
A batalha contra o “imperador de todos os males”, para usar o epíteto dado pelo médico indo-americano Siddhartha Mukherjee, foi pautada durante séculos por medidas extremas.Era um vale-tudo para evitar que o câncer prosperasse e se alastrasse. Desde o grego Galeno (129-216), que preconizava a cura do tumor com inapeláveis remoções cirúrgicas sem anestesia, até regimes recentes de quimioterapia, capazes de exterminar células alteradas, mas também de deixar pessoas de cama com náusea, fraqueza e queda de cabelo, a guerra contra uma legião de doenças conhecidas por um nome em comum — câncer — colheu avanços cobrando um inglório preço em termos de qualidade de vida. Felizmente, os tempos mudaram. E, como expôs o maior congresso de oncologia do planeta, a tendência agora é buscar tratamentos menos radicais ou mutilantes que, ainda assim, sejam seguros, eficazes e de poucos efeitos colaterais.
Estudos robustos recém-apresentados na reunião anual da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco, na sigla em inglês), em Chicago, indicam que medicamentos pouco tóxicos e cirurgias menos invasivas estão ganhando território na luta contra diversos tipos de câncer. Esse movimento, batizado de descalonamento, anda de mãos dadas com estratégias personalizadas para derrotar as células cancerígenas e com o princípio de que não basta olhar para a doença — é preciso cuidar do paciente de forma global. Tal conceito defende que a intervenção terapêutica não deve mais ser encarada como sinônimo de constante sofrimento e prejuízos que se estendem até após a recuperação. “Toda vez que a gente consegue descalonar o tratamento, seja na cirurgia, na químio ou na imunoterapia, o paciente ganha qualidade de vida”, diz o oncologista Paulo Lages, do Grupo Oncoclínicas de Brasília, um dos 40 000 médicos presentes no evento da Asco.
A proposta que expressa com mais clareza essa nova linha de pensamento foi direcionada ao câncer de colo de útero, um dos mais prevalentes no Brasil — são esperados mais de 17 000 novos casos neste ano. Causado a partir de uma infecção pelo vírus HPV, ele é o quarto mais detectado no mundo. O tratamento usualmente prescrito, sobretudo nos casos iniciais, é a remoção total do útero, dos ovários e demais tecidos ao redor. Ela é efetiva, mas põe a mulher imediatamente na menopausa — má notícia para os milhares delas que recebem o diagnóstico antes dos 40 anos, e passam a sofrer com ondas de calor, perda da libido e infertilidade. Cientistas canadenses, porém, testaram um procedimento menos brutal que pode substituir a técnica convencional com sucesso: a histerectomia simples, que prevê a retirada apenas da região acometida, o útero.
Em pesquisa divulgada no congresso, foi demonstrado que os resultados de ambos os métodos — o radical e o mais ameno — são equivalentes no que diz respeito à sobrevida livre do reaparecimento da doença. Mas com uma grande vantagem: o procedimento sem agressividade reduziu complicações no pós-operatório, permitiu uma vida sexual mais ativa e legou maior satisfação com o prórpio corpo.
Na esteira de intervenções menos extensas, o primeiro estudo controlado a comparar a cirurgia aberta com a técnica minimamente invasiva (feita com furos no abdômen) em pessoas com câncer de pâncreas indicou que, sim, é possível optar pela tática menos pesada, o que ainda resulta em menor tempo de internação e risco de infecções reduzido. O câncer de pâncreas, sublinhe-se, é complexo por ser silencioso e altamente letal. Removido em sua fase inicial, autoriza esperança — ainda assim, a taxa de sobrevida em cinco anos depois do procedimento é de elevados 44%. Cirurgias menos drásticas evitam, nesse contexto, perigos e sofrimentos adicionais.
No caso do câncer de reto, a porção final do intestino, especialistas relataram que é viável suprimir a radioterapia antes de extrair a área afetada em pacientes com tumores localmente avançados que respondem bem à quimioterapia. Retirar um tratamento extra no pacote resulta em menos reações adversas. “A radioterapia é uma boa forma de tratamento, mas pode produzir efeitos colaterais na própria porção final do aparelho digestivo e na bexiga, gerando disfunções sexuais e, principalmente na mulher, infertilidade”, diz Paulo Hoff, presidente da Oncologia D’Or. No Brasil, onde aparelhos de radioterapia nem sempre são acessíveis em algumas regiões, o achado vem a calhar.
Diversas pesquisas apresentadas na Asco tiveram como centro de atenção alternativas para evitar o retorno dos tumores, as chamadas recidivas, preocupação perene. No câncer de mama, um estudo com 5 101 mulheres com o subtipo responsável por 70% dos episódios da enfermidade comprovou que é vantajoso utilizar logo na fase inicial um medicamento normalmente empregado só quando o problema se disseminou. Com a adoção do remédio ribociclibe houve redução de 25% no risco de volta da doença quando ele é combinado à terapia hormonal.
No campo dos fármacos, outro medicamento, o mirvetuximabe soravtansina, demonstrou melhora na sobrevida de mulheres com quadros avançados ou recorrentes de câncer de ovário — feito digno de nota para um tumor duro na queda. A façanha obtida em experimento com 453 mulheres não parou por aí: a medicação foi 26% superior nesse benefício à quimioterapia, opção que não deve ser descartada, claro, mas oferece muito mais reações adversas. A droga de nome complicado tem a capacidade de mirar, com precisão, o ponto fraco da doença — ao contrário da químio, que mata células normais para levar consigo as problemáticas. Seu diferencial é justamente atacar uma estrutura-chave afeita a alimentar os tumores. “É o melhor ataque contra o câncer ovariano”, disse, em painel do congresso, Kathleen Moore, pesquisadora da Universidade de Oklahoma.
Mesmo males mais raros e considerados desafiadores entram no rol dos avanços. Havia expectativa, no celebrado congresso americano, quanto ao anúncio dos resultados de um estudo com um tratamento para o glioma, tipo agressivo de câncer cerebral. Em pacientes com uma mutação genética, o medicamento elevou as taxas de sobrevivência, retardou o crescimento da lesão e diminuiu a necessidade de se investir em medicações tóxicas. Com essas descobertas, pode-se chegar, enfim, a uma terapia pioneira , exclusivamente direcionada a tumores dessa categoria. “É clinicamente significativo, porque os pacientes diagnosticados são tipicamente jovens e indivíduos saudáveis”, afirma Ingo Mellinghoff, médico do reputado Memorial Sloan Kettering Cancer Center, em Nova York.
Técnicas que revolucionaram a oncologia nos últimos anos ganham espaço e notoriedade, contra o radicalismo de antes. É o caso da imunoterapia, que recruta o sistema imune da própria pessoa para bombardear o câncer — e confirma, em investigações recentes, a vocação para atacar tumores de pulmão antes de uma eventual cirurgia. Aplauda-se também uma técnica conhecida como CAR-T, que, ao treinar células de defesa em laboratório e reintroduzi-las no paciente, promove a caçada ao câncer hematológico. Na Asco, essa inovação provou seu valor contra o mieloma múltiplo, enfermidade de difícil tratamento. Aplicadas em indivíduos que não respondiam ao tratamento-padrão, as células modificadas reduziram em 74% o avanço da doença após dezesseis meses de acompanhamento.
O atual momento na lida contra o câncer não significa que ferramentas potentes e antigas caiam no ostracismo. A doença continuará a desafiar a medicina e, quanto mais recursos efetivos existirem, melhor. Unânime, porém, é a noção de que se pode (e se deve) tratar o paciente sem fazê-lo sucumbir ou sofrer demais. Nesse sentido, a avenida está aberta, agora sem tantas cicatrizes.
Fonte: Veja
- Cigarros eletrônicos e agrotóxicos são desafios na prevenção do câncer
- Entenda o que é um câncer em estágio 4
- Nova vacina contra câncer de pele entra em última fase de testes
- Casos de câncer em pessoas jovens estão aumentando; veja como prevenir
- Comissão Europeia aprova medicamento para tratar o cancêr de pulmão de células não pequenas
- Lançamento: autores do livro Slow Medicine - Sem pressa para cuidar bem autografam na Livraria da Vila Higienópolis
- OC Acesso: Oncoclínicas lança alternativa de tratamentos oncológicos para pacientes sem plano de saúde
- O assustador crescimento do câncer colorretal em pessoas de até 50 anos
- Por que os casos de câncer estão aumentando?
- 25% dos tipos raros de câncer são diagnosticados incorretamente
- Câncer: desigualdade racial aumenta mortes entre população negra
- Exame de sangue com IA realiza detecção precoce de nove tipos de câncer
- Há grande disparidade de acesso para população negra e indígena no Brasil, aponta presidente da BMS Foundation
- Casos de câncer de mama crescem no mundo, e muitas mulheres continuam sem cuidado, diz comissão da Lancet
- Prevenção na saúde: Pesquisa aponta relação entre sedentarismo e casos de câncer
- Tecnologia é a grande aposta dos novos tratamentos contra câncer de próstata
- Abril lilás: câncer de testículo matou quase 4 mil entre 2012 e 2021
- 12 sinais de câncer de pulmão que são comuns em quem nunca fumou
- Depois do diagnóstico de câncer de mama, ela escolheu mudar de rota
- Congresso Internacional Oncologia D’Or, com 250 palestrantes, começou hoje no Rio de Janeiro
- É falso o vídeo do médico Drauzio Varella dizendo que a vacina da dengue causa câncer
- Câncer de mama: quem cuida de quem cuida?
- Como fazer detecção precoce do câncer de pâncreas? Cientistas buscam alternativas
- Câncer silencioso: entenda os casos em que a doença não dá sinais
- Casos de câncer devem aumentar 77% até 2050 ligados ao envelhecimento da população
- Casos de câncer de próstata aumentarão devido ao envelhecimento populacional, diz estudo
- Câncer raro pode ser confundido com manifestações da puberdade; conheça os sinais de alerta
- Sinal de câncer colorretal que não deve ser ignorado
- Vacinação contra HPV, principal causador de câncer de útero, passa a ser em dose única
- Câncer de pele de Monja Coen: por que manchas pioram com quimioterapia?
- Câncer de testículo: veja os sintomas e opções de tratamento
- Dez anos da vacinação contra o HPV: entenda por que a baixa adesão preocupa os especialistas
- A nova cesta básica, os ultraprocessados e o câncer
- Cigarro destrói DNA, dizem pesquisadores
- América Latina tem a segunda maior taxa de mortalidade por câncer de colo do útero
- Crianças que tiveram câncer não recebem o acompanhamento devido quando crescem
- O câncer pode se tornar uma doença crônica?
- Fiocruz lança Estratégia para Terapias Avançadas no tratamento de câncer e doenças raras
- Câncer de mama: taxa de mortalidade aumenta 86,2% em 22 anos no Brasil; entenda os motivos
- Como contar para os filhos sobre o câncer? Especialistas dão dicas
- Ministra da Saúde diz que terapia contra câncer no sangue será tratamento revolucionário para população
- Kate Middleton adiou anúncio de câncer para preparar e contar a filhos antes, diz jornal: Tempo certo para eles
- Ferida que sangra e não cicatriza pode sinalizar um câncer de pele
- Médicos alertam para crescimento de casos de câncer de mama em mulheres com menos de 40 anos
- Exames periódicos e vacinação são a melhor forma de prevenir o câncer do colo do útero
- Os novos (e promissores) testes não invasivos para câncer colorretal
- Pesquisadores do Butantan estudam uso de BCG recombinante como tratamento para câncer de bexiga
- Pesquisa analisa influência da região de residência no tratamento do câncer do colo do útero em Minas
- Desinformação e preconceito: vacina contra HPV previne câncer, mas adesão no Brasil segue abaixo da meta
- Prevenção do câncer: governo de SP inicia Campanha de Multivacinação nas escolas
- Câncer de colo de útero: entenda por que você não deve pular o Papanicolau
- Câncer de colo do útero: entenda doença que pode ser evitada com vacinação
- O caminho para eliminar o câncer do colo de útero na América Latina
- Exame de sangue vira promessa para detecção precoce de câncer de cólon
- O que podemos fazer para prevenir o câncer colorretal?
- Casos de câncer em jovens aumentam e a vilã pode ser alimentação
- Cientistas criam novos testes para diagnosticar câncer colorretal
- Comunidade LGBTQIAP+ é quase invisível para estudos sobre câncer
- O avanço da Inteligência Artificial no rastreio do câncer de mama
- Câncer de colo de útero: entenda a importância da vacina na prevenção
- CAR-T Cell: estudo clínico de terapia contra câncer no sangue começa na sexta-feira (15), diz USP
- Proposta prioriza o uso de telessaúde por paciente com câncer
- Câmara aprova reconhecimento a empresa que contratar mulheres com câncer de mama
- Primeiro, um diagnóstico de câncer; depois, uma decisão sobre fertilidade
- Lei contra o câncer requer esforços intersetoriais
- Dia da Mulher: ‘Nunca pensei que um câncer poderia me levar à menopausa aos 25 anos’, diz influenciadora
- OMS: mundo poderá eliminar um câncer pela 1ª vez; entenda
- Quais são os fatores que aumentam o risco de câncer conforme envelhecemos?
- Perder peso sem motivo aparente está associado ao maior risco de câncer
- Preta Gil diz que o câncer mudou a percepção da morte: Não tira mais o meu sono
- Vamos falar sobre obesidade e câncer
- Dia Mundial da Obesidade: no Brasil, capitais têm mais de 60% da população apresenta excesso de peso
- Qualidade de vida como prescrição médica
- Câncer de próstata: cientistas descobrem que existem dois tipos diferentes da doença; entenda
- Desigualdades socioeconômicas limitam o acesso a novas terapias contra o câncer
- Março Azul: um farol de esperança contra o câncer de intestino
- Pacientes com câncer podem se vacinar contra a dengue?
- Política Nacional de Combate ao Câncer tem desafios a enfrentar
- Como o estudo da epigenética impactará o controle do câncer de próstata
- Para alcançar a cura do câncer metastático é preciso furar bolhas e trabalhar em equipe, diz especialista
- Perda de peso expressiva e não intencional pode ser indício de câncer, revela estudo
- Car-T: pacientes que lutam contra o câncer há anos passam por terapia promissora e resultados impressionam; veja
- Mulher descobre câncer após tirar ‘sinal’ do nariz
- Novas tecnologias ômicas abrem caminho para imunoterapias mais eficazes contra o câncer
- Câncer: estudo aponta que estresse influencia no tamanho de tumores; entenda como
- Por que o risco de ter câncer aumenta com a idade
- Terapia contra câncer aprovada nos EUA usa célula do corpo como droga viva
- Inca divulga código para tratar e prevenir vários tipos de câncer
- Veneno de aranha brasileira vira esperança de tratamento contra câncer
- SUS passa a oferecer teste que aprimora diagnóstico de câncer de pulmão
- Tecnologia muda conceito de câncer raro
- Câncer colorretal: estudo aponta importância da ressonância magnética
- Câncer: crescem os números, a incidência e as disparidades
- A cirurgia plástica no resgate da autoestima após o câncer de pele
- Me sinto decapitado: por que cada vez mais homens têm o pênis amputado no Brasil?
- Autocoleta para HPV ajuda na prevenção, mas não substitui outros exames
- Desisti de me expor a tratamentos ineficientes, diz mulher com câncer que interrompeu quimioterapia
- Uma a cada cinco mulheres com câncer de mama triplo-negativo tem metástase
- Câncer infantil: uma discussão necessária
- Cinco estados têm legislação para teste genético de câncer de mama no SUS