[ENTREVISTA] Novidades no Tratamento do Câncer de Pulmão
Confira a entrevista na íntegra.
Instituto Oncoguia - Qual foi a principal mudança no cenário terapêutico do câncer de pulmão nos últimos anos?
William Nassib William Junior - Nos últimos anos, vimos vários avanços no tratamento do câncer de pulmão. Antigamente, o câncer de pulmão era dividido em dois grandes grupos: carcinoma de pequenas células e carcinoma de não pequenas células. Havia pouca importância em se diferenciar os subtipos de carcinoma não pequenas células. Esse conceito mudou. Hoje em dia, fazemos o possível para subclassificar corretamente o câncer de pulmão de não pequenas células, uma vez que o tratamento pode variar de acordo com o subtipo do tumor. Por exemplo, a quimioterapia pemetrexede é pouco eficaz em tumores escamosos e não deve ser utilizada nesta situação. A droga alvo bevacizumabe é associada a sangramento grave em pacientes com tumores escamosos, e ela só dever ser utilizada no subtipo não escamoso. O conceito de classificação de tumores tem se tornado cada vez mais refinado, e hoje em dia, além da aparência ao microscópio, utilizamos testes moleculares para caracterizar de forma mais detalhada o câncer de pulmão de não pequenas células (especialmente o subtipo adenocarcinoma). Pacientes com alterações moleculares no gene do EGFR e ALK podem, por exemplo, ser tratados com drogas bastante específicas com altas chances de sucesso.
Instituto Oncoguia - Fale sobre o papel dos marcadores tumorais no cenário das novas descobertas terapêuticas.
William Nassib William Junior - Dois biomarcadores avaliados nas biópsias de câncer de pulmão de não pequenas células não escamosos são rotineiramente utilizados para manejo da doença metastática. Mutações no gene do EGFR em geral predizem uma alta chance de resposta e controle prologado de doença se os pacientes forem expostos a inibidores de tirosina quinase (por exemplo, gefitinibe, erlotinibe, afatinibe). Translocações do gene Alk em geral predizem benefício grande com a droga crizotinibe. Outros testes moleculares estão em desenvolvimento para tratamento do câncer de pulmão de não pequenas células, e creio que cada vez mais teremos aprovações de medicamentos para serem utilizados em situações específicas definidas pelo perfil molecular do tumor. Como exemplo de novos marcadores que podem guiar o tratamento no futuro próximo, podemos citar a expressão de MET (para tratamento com o anticorpo onartuzumab – MetMAb), alterações do gene ROS1 (para tratamento com crizotinibe) e mutações no gene KRAS (para tratamento com selumetinib).
Instituto Oncoguia - A descoberta de alvos terapêuticos do adenocarcinoma determinou o desenvolvimento de terapias muito mais eficazes que as tradicionalmente usadas no tratamento da neoplasia. Novos alvos terapêuticos vêm sendo descobertos em outros tipos de câncer de pulmão?
William Nassib William Junior - O desenvolvimento de marcadores em adenocarcinomas está mais avançado quando comparado aos outros subtipos histológicos. No entanto, estamos também vendo progressos em câncer de pulmão do tipo escamoso. Recentemente, foi publicado o sequenciamento detalhado de mais de uma centena de amostras de carcinoma de pulmão escamoso. Além de mutações gênicas, outras alterações moleculares têm sido identificadas neste subtipo, como por exemplo, amplificação do gene FGFR, redução da expressão da enzima PTEN, ativação da via de sinalização da PI3 quinase. A caracterização molecular do câncer de pulmão de pequenas células ainda deixa a desejar.
Instituto Oncoguia - Com relação ao carcinoma de células escamosas, há mutações genéticas já descobertas que sinalizam para o desenvolvimento de novas terapias alvo? Há estudos em curso?
William Nassib William Junior - Absolutamente. As alterações moleculares mais promissoras para desenvolvimento terapêutico incluem mutações do gene DDR2 e mutações de inativação do gene BRAF (não necessariamente apenas em tumores escamosos). Estes subtipos moleculares estão sendo tratados com dasatinibe em um estudo clínico em andamento nos Estados Unidos. Amplificações do gene FGFR em carcinoma escamoso estão sendo estudadas em um protocolo clinico com inibidos específico desta via de sinalização. Em um futuro breve, veremos resultados dos estudos cínicos envolvendo inibidores da PI3 quinase em pacientes com alterações nesta via (incluindo perda do PTEN, mutações no gene PIK3CA, etc.).
Instituto Oncoguia - Quais são as principais terapias alvo existentes no mercado? Existe já uma segunda geração de medicamentos em estudo?
William Nassib William Junior - As drogas alvo já aprovadas para tratamento de câncer de pulmão metastático incluem bevacizumabe (para uso na primeira linha em pacientes com tumores não escamosos, em combinação com quimioterapia), gefitinibe e erlotinibe (com eficácia principal como monoterapia em pacientes com mutação do EGFR) e crizotinibe (aprovado somente para uso em pacientes com alteração do gene Alk). Existe uma série de medicamentos de segunda geração que podem ser aprovados em um futuro próximo. Como exemplo, destaca-se o inibidor irreversível do EGFR e HER-2 afatinibe (que já demonstrou eficácia na primeira linha em estudo de fase 3 em tumores com mutação do EGFR). Outros inibidores de EGFR estão sendo avaliados, bem como inibidores de Alk de segunda geração.
Instituto Oncoguia - Fale sobre o papel da imunoterapia no tratamento do câncer de pulmão. Quais são as principais novidades?
William Nassib William Junior - Nunca houve um papel muito bem definido da imunoterapia no câncer de pulmão de não pequenas células. O enfoque principal era no desenvolvimento de vacinas, e ainda aguardamos os resultados do estudo grande de fase 3 com vacina contra o antígeno MAGE na adjuvância. Em 2012, no entanto, dois estudos iniciais com anticorpos direcionados à via PD-1, PDL-1 foram apresentados. Estas vias regulam imunidade e acredita-se que seu bloqueio permite uma resposta imunológica do organismo contra o tumor. Os estudos publicados no New England Journal of Medicine demonstraram taxas de respostas promissoras em pacientes com carcinoma de pulmão previamente tratados. Mais importante, o perfil de toxicidade foi favorável, e algumas das respostas foram duradouras. Estes resultados abriram as portas para o desenvolvimento de estratégias imunoterápicas para tumores sólidos, que não rim e melanoma, incluindo os tumores de pulmão.
Instituto Oncoguia - E houve recentes avanços no desenvolvimento de quimioterapias? E estudos em torno de novos usos para quimioterapias já existentes?
William Nassib William Junior - Houve avanços no uso de quimioterapia para carcinoma de pulmão. Podemos citar a recente aprovação do nab-paclitaxel para pacientes com carcinoma de pulmão de não pequenas células nos Estados Unidos. Esta droga não demonstrou aumento de sobrevida em relação ao paclitaxel, porém houve um aumento nas taxas de resposta (desfecho primário do estudo), e esta se torna mais uma opção para tratamento da doença metastática. Os avanços quimioterápicos mais importantes, entretanto, vieram da melhor compreensão de como utilizar drogas que já haviam sido aprovadas, especialmente no que se refere ao uso de tratamento de manutenção. Dados recentes, por exemplo, sugerem que pemetrexede aumenta a sobrevida quando utilizado como segunda linha precoce (ou "switch maintenance”) em pacientes não expostos a pemetrexede na primeira linha. Pemetrexede também aumenta a sobrevida quando utilizado como tratamento de manutenção continuada após indução com platina e pemetrexede. Estudo multicêntrico predominantemente brasileiro apresentado em 2012 também estabeleceu benefício de sobrevida global em pacientes com câncer de pulmão metastático com baixo índice de desempenho tratados com a combinação de carboplatina e pemetrexede.
Instituto Oncoguia - E no tratamento radioterápico, o que há de novo ou que poderá estar disponível em breve?
William Nassib William Junior - Os dois avanços que posso citar em termos de radioterapia é o desenvolvimento do tratamento com prótons e o uso de radioterapia estereotáxica para tumores primários de pulmão. O tratamento com prótons teoricamente oferece benefício no sentido de permitir melhor confinamento da dose de radiação, com menos lesão de estruturas normais ao redor do tumor. É ainda um tratamento de alto custo, e estudos estão em andamento para analisar se as vantagens teóricas irão se traduzir em menor incidência de efeitos colaterais clinicamente importantes, e possivelmente melhor controle do tumor. A radioterapia estereotáxica é uma modalidade de tratamento desenvolvida para administração de altas doses de radiação em uma área de tumor pequena, em geral administrada diariamente ao longo de poucos dias (menos de 1 semana). Acredita-se que o controle local de lesões pequenas com radioterapia estereotáxica possa ser comparável ao que se obtém com cirurgia, porém sem necessidade de exposição aos riscos peri-operatórios. Entretanto, estudos ainda estão em andamento para se comprovar a eficácia desta modalidade terapêutica.
Instituto Oncoguia - A cirurgia é o único tratamento curativo possível ao câncer de pulmão, hoje?O que há de mais novo no tratamento cirúrgico do câncer de pulmão?
William Nassib William Junior - Cirurgia não é o único tratamento curativo, mas ainda é o tratamento padrão e preferencial em pacientes com carcinoma de pulmão de não pequenas células não avançado e que são candidatos a uma operação. Entretanto, radioterapia com ou sem quimioterapia concomitante pode ser utilizada com intuito curativo em uma série de situações clínicas. A meu ver, um dos avanços principais em cirurgia torácica é o desenvolvimento de técnicas minimamente invasivas, que permitem a ressecção tumoral com incisões pequenas, possivelmente com menos riscos peri-operatórios e recuperação pós-cirúrgica acelerada. Algumas destas técnicas utilizam robôs. Entretanto, os estudos clínicos estão em andamento para demonstrar com maior clareza as vantagens e desvantagens das técnicas minimamente invasivas.
Instituto Oncoguia - O que mais chamou a atenção da comunidade médica no último encontro anual da ASCO?
William Nassib William Junior - Este foi um encontro extremamente interessante para câncer de pulmão de não pequenas células. Os principais destaques foram os trabalhos demostrando: benefício de carboplatina e pemetrexede em pacientes com baixo índice de desempenho em um estudo predominantemente brasileiro; benefício de afatinibe na primeira linha em comparação à quimioterapia em pacientes com mutação do EGFR; benefício do uso de pemetrexede de manutenção em pacientes que receberam tratamento de primeira linha com platina e pemetrexede; atividade de crizotinibe em pacientes com alteração do gene ROS1; atividade de selumetinibe e docetaxel em pacientes com mutações no gene KRAS; e, atividade de anticorpos direcionados a PD-1 em pacientes previamente tratados.- Conitec abre CP para tratamento de Leucemia no SUS
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