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  • Carlos Freire Mascarenhas Cordeiro - Leucemia Linfoide Aguda (LLA)
    Falem, expressem seu amor, digam tudo que tiver no seu coração...
Aquele domingo era seu último dia!
 
Querido Amigos(s), quero compartilhar com vocês a minha experiência como acompanhante noturno e diário de meu filho Mauro Santos Cordeiro, 25 anos, músico, diagnosticado com Leucemia no dia 23/12/2014, em Salvador - Bahia.
 
Parece, amigos, que estamos dormindo e que vamos acordar de um pesadelo. No começo da doença você acredita, porque tem um excelente plano de saúde e muita fé, que tudo caminhará bem, sem atropelos. Entretanto, com o passar do tempo, você vai vendo que a família e os amigos são os fatores mais importantes do tratamento, sem querer, de forma alguma, minimizar o trabalho da equipe de oncologia e das enfermeiras. Em outras palavras, amigos, quando a equipe médica vai embora é apenas você e seu paciente e isso fará a diferença.
 
Assim, Mauro era um músico que tinha uma vida normal. Casou-se com Michely aos 19 anos, tinha carro, casa, amigos mil, tudo maravilhosamente bem... De repente, umas dores no lado esquerdo e aí o diagnóstico: leucemia! Das mais agressivas...
 
Prontamente, Iara, a mãe e Michely, a esposa, foram fazendo as escalas de acompanhantes, períodos de 8 horas para cada familiar. Sai na frente e disse: Podem deixar que eu dormirei com ele todas as noites: sábado, domingos, feriados e dias santos: todos os dias! E, assim, permaneci acompanhando Mauro onde ele fosse.
 
Foram dias muito legais: assistíamos televisão, conversávamos muito. Durante o tratamento Mauro fez transplante autólogo (dele para ele mesmo). Foi um sucesso...
 
Depois de um tempo, a doença voltou. Nesse novo internamento, Mauro voltou para o hospital cego, porém, mais tarde, voltou a enxergar. Depois, noutro momento, voltou para o hospital sem movimentar mãos e braços. Tudo isso, acompanhado pela Equipe de Hemato-oncologia do Hospital São Rafael, a qual sempre esteve atenta ao quadro clínico de Mauro e demonstravam muito amor por ele.
 
Mais adiante, depois de várias reuniões entre médicos e família, ficou acertado que eu seria o doador de medula óssea de Mauro. Foram feitos todos os procedimentos e no dia 15/06/2016, nos internamos para o transplante.
 
Existe, caros amigos, dentro dos departamentos de oncologia um jargão chamado: "dia da pega". Na verdade, é o dia em que a medula do doador foi aceita pelo receptor, geralmente 15 dias. Depois do transplante, realizado em 01/07/2016, Mauro estava muito feliz. Ele chegou a postar no face que aquele dia era o 1º de sua nova vida. Porém, os dias foram passando, a espera era torturante, cada dia Mauro apresentava uma piora.
 
Na qualidade de pai, continuava acompanhando tudo, todos os dias. Certa noite, no 8º dia do transplante, Mauro não podia engolir a saliva porque senão vomitaria. Que tortura ver aquilo num filho... Passava os dias e noites cuspindo num saco. Não podia comer nem beber nada. Confesso, não sabia que ele não chegaria ao 15º dia, senão não sairia mais de perto dele.
 
Eu o amava muito, era tudo pra mim: bom filho, bom professor, bom amigo, bom irmão... No sábado, 09/07/2016, dormi no hospital. Mauro apresentava um quadro de dor, vômito e falta de ar, as enfermeiras entravam no quarto e saiam toda hora. Pela manhã, Michely a esposa dele, chegou e disse que ficaria com ele naquele domingo e eu voltei pra casa.
 
Naquele dia, 10/07/2016, domingo, eu notei de casa um detalhe diferente: Mauro estava com o celular desligado e não aparecia nem no zap nem no face. Achei estranho porque ele só andava conectado. Preocupado com essa situação, fui correndo para o hospital.
 
No quarto encontrei Michely muito triste e Mauro com os dois olhos completamente vermelhos, cor de sangue. Nesse instante, o qual era o último dia que o veria com vida, ele olha dentro dos meus olhos e fala uma frase que nunca mais esquecerei: "Pai, não posso fazer mais nada"!
 
Caros amigos que leram até aqui, nesse momento eu não falei nada. Isso mesmo: fiquei calado. Meu Deus, como eu queria ter falado tantas coisas que não falei... Por isso, lhes digo: não façam como eu. Falem, expressem seu amor, digam tudo que tiver no seu coração. Abracem, beijem...
 
Aquele domingo era o seu último dia e eu não sabia. Voltei pra casa e na segunda pela manhã, Mauro foi pra UTI e morreu em 15/07/2016.
 
Hoje, convivo com essa dor de não ter falado nada no momento que ele mais precisava ouvir!
 
Carlos Freire Mascarenhas