X Fórum Nacional de Políticas de Saúde em Oncologia - Dia 04 - 06/08/2020

Acesso a novas tecnologias no Brasil: sugestões para o aperfeiçoamento do modelo para a oncologia

Coordenadora: Luciana Holtz, Fundadora e Presidente do Instituto Oncoguia
Debatedores: Tiago Matos, Diretor de Advocacy do Instituto Oncoguia e Rafael Kaliks, Oncologista no Hospital Israelita Albert Einstein e Diretor Científico Instituto Oncoguia

  • Oncoguia entrevista: Denizar Vianna – Ex-secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde e Professor Associado da UERJ

Denizar falou sobre a criação de uma agência única de regulação para a área da saúde. Para ele, isso garantiria celeridade ao processo de incorporação de novas tecnologias, reduziria a redundância e melhoraria inclusive o preço, pois haveria um poder de negociação maior para os dois sistemas, público e privado, com maior poder de barganha, diminuindo, inclusive, a judicialização.

Denizar explicou que com uma agência única, as atribuições da Anvisa se manteriam, pois hoje ela tem um papel bem definido. Mas ele acredita que outras atribuições como as da CMED, na definição de preços, poderia estar nessa agência única. Além disso, ele também acredita que haveria ganhos em unir setor público e privado para um momento único de avaliação das novas tecnologias, pois hoje, o que a COSAÚDE faz, muitas vezes já foi feito pela Conitec e quem perde é o paciente com a demora nas avaliações e aprovações.

Sobre a questão das incorporações, Denizar comentou que hoje, o processo de avaliação de novas tecnologias é reativo, a partir da solicitação de alguma sociedade e, para ele, isso deveria se inverter. Entre suas sugestões está a definição de prioridades por tipo de doença, necessidades não atendidas para se criar um cronograma de incorporações baseado nessas necessidades e prioridades.

Além disso, Denizar apontou outras sugestões para o aperfeiçoamento do sistema. Em sua opinião, seria bom pro gestor, se no início do ano soubesse o orçamento que tem pra incorporar, tornando assim as incorporações proativas; determinação de valores baseados na realidade econômica do país; a Conitec precisaria desvincular-se do foco econômico e dar mais mérito às avaliações científicas; a independência dessa agência única para que as escolhas sejam feitas de maneira mais consciente; mudança na forma de pagamento por Apac, o que prejudica o acesso a medicamentos incorporados e torna a saúde desigual dentro de um mesmo sistema; compra centralizada de itens de alto custo e distribuição pros estados, e garantir transparência a todos esses processos a fim de torná-los mais legítimos. 

  • Da pesquisa clínica ao acesso do paciente: compreendendo todas as etapas - Vanessa Teich, Superintendente de Economia da Saúde do Hospital Israelita Albert Einstein

Vanessa explicou passo a passo do processo de incorporação de novas tecnologias, mostrando qual órgão é responsável por qual etapa do processo. Hoje, esse processo de incorporação começa pela pesquisa clínica, segue para o registro na Anvisa, depois passa pela avaliação de preço pelo Cmed e depois segue para avaliação da Conitec, para ser incorporado ao SUS, pela etapa de financiamento e, por último, pela negociação de preço.

Para Vanessa, um primeiro erro é atrelar a precificação à incorporação. Segundo ela, esse fluxo poderia ser da seguinte maneira: medicamentos de categoria 1, que trazem ganhos terapêuticos, teriam que obrigatoriamente passar pela Conitec com critério de precificação ou custo efetividade. Todos tratamentos inovadores passariam pela agência, atrelando essa avaliação de precificação. Depois haveria definição de orçamento anual para incorporação de novas tecnologias e então haveria a definição de critérios de priorização para incorporação, avaliando o que seria incorporado dentro do orçamento disponível.

De acordo com a palestrante, dessa forma, haveriam orçamentos anuais, o que possibilitaria incorporações anuais, e não mais a cada dois ou três anos como acontece hoje. Tudo isso garantiria eficiência maior no processo de alocação dos recursos públicos.

Outra sugestão de Vanessa é a criação de um processo em que se facilite o acompanhamento de dados do mundo real de pacientes tratados com medicamentos de alto custo, possibilitando avaliar se, na prática, os resultados clínicos estão sendo mudados e se os gastos estão trazendo resultados.

  • Processo de definição de preço: barreira ou solução? - Renata Curi, Advogada do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde, da Fiocruz

Renata iniciou apontando como um dos problemas da precificação dos medicamentos e novas tecnologias no Brasil o fato de isso ser definido pela CMED, que é um órgão interministerial com papel de promover regulação econômica, apontar preço e percentual de reajuste além de monitorar o mercado de medicamentos, mas que não tem independência.

No entanto, sua função é importante porque a CMED intervém quando há prática abusiva de preços, por exemplo, e também acompanha questões de desabastecimento olhando para reajuste de preços e possibilitando o reabastecimento.

Entre os pontos positivos da forma como a precificação é realizada hoje, Renata aponta o poder de barganha que temos e a negociação com base no valor mais baixo aplicado pelo comparativo com outros países. Por outro lado, Renata aponta que o preço real não necessariamente representa o preço real do medicamento devido à forma de precificação diferenciada entre todos os países. Outro problema é que em muitos países, os acordos entre indústria e estado são sigilosos, assim, o preço avaliado não é o preço real praticado pelo país que usamos como base de comparação.

Algumas alternativas apontadas pela palestrante com base no que funciona em outros países são o uso de preços diferenciados e descontos confidenciais, definição de valor terapêutico de novas tecnologias, ou seja, avalia a efetividade do medicamento em condições reais de uso e apenas depois o preço é atribuído.

Por fim, Renata aponta como questões a serem consideradas a relação de colaboração entre estado e indústria farmacêutica, autonomia na definição do que é valor, integração de políticas de uso racional de medicamentos e orçamentos, estímulo para desenvolvimento tecnológico no Brasil, integração entre as etapas de acesso e estímulo à inovação.  

  • Modelos internacionais de ATS (Avaliação em Tecnologias de Saúde) - Felipe Roitberg, Oncologista do Programa de lideranças da União Internacional de Controle do Câncer

Felipe explicou que a ESMO, sociedade europeia de oncologia, considera a definição de valor dos medicamentos com base em seus benefícios para o paciente e ressaltou que quando se fala de valor, é preciso pensar nos benefícios que o tratamento avaliado proporcionará ao paciente.

O oncologista destacou ainda que quando se fala em acesso, existe uma diferença muito grande entre países de renda alta, intermediária e baixa. O Brasil, segundo ele, está na faixa de intermediária para alta. Então, o que falta é alocação adequada de recursos e investimento pro que queremos. Nossa posição não é tão desfavorecida quanto a gente pensa. Mas o problema é que existe disparidade social.

Felipe apontou que menos de 10% dos países não conseguem considerar custo em relação a drogas essenciais. Quanto quero pagar por uma vida salva? Isso tem que ser discutido e essa discussão passa por financiamento e alocação de recursos. Estudos com informação sobre qualidade de vida, ajudariam nessa análise mais criteriosa das incorporações.

  • Sugestões para o aprimoramento do processo de ATS - Ivo Bucaresky, Economista, Consultor independente e ex-Diretor da Anvisa

Ivo destacou que no Brasil temos um sistema misto (público e privado) e que é preciso levar em conta as características particulares do país quando fala-se em incorporação. 

Para ele, é preciso pensar na criação de um processo de ATS voltado para a realidade do Brasil, discutindo-se indicadores de custo-efetividade, de qualidade de vida, valores que queremos gastar, variáveis como tipo de patologias, questão orçamentária, quem fica com qual custo para si, entre outros aspectos. Pois hoje, do jeito que é feito, com a demanda de um sistema que busca entregar tudo para todos, há partes que acabam prejudicadas.

Outro ponto importante destacado pelo palestrante é que as tecnologias se inovam a todo momento e, com isso, é preciso discutir-se a criação de um orçamento mínimo e positivo para a saúde, além de melhoria na precificação das novas tecnologias, novos modelos de remuneração e melhorias na gestão. Só assim, Ivo acredita que poderia se reduzir as dificuldades de acesso e as diferenças de incorporação dentro dos diferentes sistemas de saúde.

Por fim, o economista falou sobre a criação de uma agência única de regulação a partir do que já existe hoje, ou seja, pegar a Anvisa e Cmed e aprimorar algumas questões antes mesmo da junção e inclusão da Conitec. 

Dados para criação de políticas públicas baseadas em evidência
Coordenadora: Luciana Holtz, Fundadora e Presidente do Instituto Oncoguia

  • O radar do câncer - André Marques, Fundador da plataforma cliqueSUS

André apresentou sua ferramenta, o cliqueSUS, e lançou ao vivo em nosso fórum a plataforma radardocancer.org.br, que tem como objetivo consolidar dados sobre o câncer no Brasil de diferentes fontes e viabilizá-los em um único lugar e de forma simples. André ressaltou a importância de se saber trabalhar e interpretar os dados hoje disponíveis sobre oncologia, pois, como destacado, por exemplo, a covid-19 acelerou o uso de dados, mas também aumentou o erro de interpretação desses dados.
Por fim, ele apresentou em detalhes o site radardocancer.org.br, que foi inaugurado com um painel completo sobre câncer de pulmão e que em breve será atualizado com outros tipos de tumor. 

  • Case Conecta SUS - Wisley Velasco, Gerente da Gerência de Informações Estratégicas em Saúde (ConectaSUS) da Superintendência de Performance da Secretaria de Estado da Saúde de Goiás

Wisley explicou que o Conecta SUS é uma forma de compilar dados e usá-los para a tomada de decisões no Estado de Goiás. Como exemplo, ele comentou o case em relação ao câncer de mama na região.

Primeiramente, foi questionado por que tantas mulheres morriam em Goiás por causa de câncer de mama sendo que a doença pode ser detectada precocemente. Com base em informações obtidas com um mapa, identificou-se como é a cobertura de mamografias no estado, apontando os municípios com baixa cobertura. Então foram-se seguindo novos questionamentos, acompanhados por levantamentos de dados e cruzamento de informações que, por fim, possibilitou concluir que a região norte do estado era a mais carente em exames preventivos e diagnóstico. Nessa mesma região, gestores pactuavam mamografias com municípios mais ao centro do estado em vez de melhorarem a infraestrutura municipal.

Com base em todos os dados obtidos por meio do Conecta SUS, sugeriu-se a realização de auditorias, chegando à possíveis soluções para o problema apresentado, como questões de registro das informações, auditorias nos mamógrafos existentes e sem produção, habilitação de novos serviços e revisão de pactuações.

  • Case Fosp: a experiência do registro de dados de São Paulo - José Eluf Neto, Diretor-presidente da Fundação Oncocentro de São Paulo (FOSP)

José Eluf apresentou alguns dados do registro hospitalar da Fundação Oncocentro, que começou a ser realizada em 2000 e coleta dados dos principais hospitais oncológicos do Estado de SP. Ao todo, são compilados dados de 72 hospitais do SUS e 1 voluntário, além disso, há 12 hospitais que não enviam os dados.

Dentre os dados de destaque, Eluf mostrou que de janeiro de 2000 a dezembro de 2019, o número de casos de câncer no estado foi superior a 1 milhão e 100 mil registros. Pela análise anual, a partir de 2015, nota-se uma redução no número de casos novos, mas que o palestrante destaca que isso não é uma boa notícia como parece, e sim demonstra que muitos casos são registrados com atraso.

Ao longo dos anos também é possível notar que nos homens, os tipos de câncer mais frequentes nos hospitais de SP têm sido: próstata, colorretal, pulmão, boca e orofaringe, e estômago. Em mulheres, os mais registrados são mama, colo do útero, colorretal, tireoide, pulmão e estômago.

Um dado importante é a percepção de que, ao longo dos anos, vem caindo o número de casos de maior gravidade, ou seja, registros em que o paciente foi diagnosticado nos estadiamentos 3 e 4. Em homens, essa queda foi de 15%. E a maioria dos casos mais graves, seguem sendo registrados no SUS, com maior frequência do que na saúde suplementar.

Outra informação curiosa apresentada foi que pacientes que chegam sem diagnóstico de câncer, demoram menos tempo para serem tratados após o diagnóstico do que aqueles que chegam já com a confirmação da doença, e isso acontece tanto no SUS quanto em convênios. Eluf aponta como duas possíveis causas a superlotação dos serviços, que, por consequência, acabam dando prioridade aos pacientes que fazem o diagnóstico na própria instituição; e a dificuldade de navegação do paciente para chegar até um hospital especializado.

  • Case Capesesp - João Paulo Reis, Diretor-presidente da Caixa de Previdência e Assistência dos Servidores da Fundação Nacional de Saúde (Capesesp)

João Paulo reafirmou o tema da mesa destacando que não dá para gerenciar a área da saúde sem dados que possam evidenciar as necessidades. Ele contou que em 1998, a Capesesp adquiriu uma ferramenta de banco de dados para que pudessem construir cenários baseados em dados reais. Tudo isso, motivados por uma necessidade não atendida da organização: muitos pacientes associados não conseguiam comprar remédios para doenças crônicas. Assim, com base nos dados levantados, puderam criar um programa de assistência farmacêutica para doenças crônicas.

Em 2001, notaram uma nova demanda: acesso a quimioterápicos orais por parte dos associados que estavam desassistidos nessa questão. Assim, criaram um novo programa em 2002, para garantir acesso à quimio oral. Esse projeto foi, inclusive, usado como base para a criação da lei da quimioterapia oral de cobertura garantida por planos de saúde. Quando surgiu o debate para a criação da lei, a Capesesp já tinha 10 anos de experiência e pode servir de exemplo para a ANS. “Isso só foi possível, pois já tínhamos experiência, dados e tomamos decisões baseadas nesses dados, criando esse programa de acesso à quimio oral”, contou o palestrante.    

Outros estudos que a organização têm feito a partir de dados coletados pelo sistema adotado internamente tem a ver com a mortalidade de câncer entre seus associados. Com a percepção do perfil dos pacientes, tipo de câncer e taxa de mortalidade, é possível investirem em ações de prevenção e promoção em saúde de maneira mais focada nas necessidades reais.

Por fim, João Paulo comentou sobre o impacto da Covid-19 nas autorizações de quimioterapia. Foi possível notar com os dados do banco interno que houve redução de 14% nas quimioterapias realizadas, que de 28% em radioterapia, 35% adiaram seus exames e 49% deixaram de internar. “Ainda não sabemos as consequências disso no futuro, mas estamos de olho para agirmos rapidamente”, concluiu. 

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